domingo, 22 de abril de 2012

Um estranho texto



Sou assim, viciada em vícios. Um gosto bizarro e incontrolável por maus hábitos. Às vezes gosto de enlouquecer, seja sóbria ou bêbada. Pareço uma chaleira a ferver o tempo todo, muitas vezes com necessidade de apitar para o mundo, na tentativa que este baixe o seu fogo por algum tempo. Mas, por mais que tente, volto sempre a ficar quente. Quente demais... Não consigo evitar, é a maneira que mais amo de viver a minha vida. Porém, não consigo deixar de olhar para as vidas chatas das pessoas medíocres, certinhas, que tentam a todo o instante manter a postura para serem aceites. No meu bairro, no autocarro, nas ruas, na televisão, até mesmo nas saídas à noite, onde vão sei lá porque, sentam-se a um canto na hora que chegam e só se levantam na hora de irem embora.
No meu mapa de existência mundial elas estão marcadas com a cor cinza e representam as áreas idiotas e nada divertidas. E isso não tem nada a ver com ser-se louco ou não. Tenho amigos que nem cervejas bebem e que são bem piores que qualquer alcoólatra que conheço. Tem a ver com o jeito com que encaramos a vida. Por vezes fico a pensar que essas pessoas “chatas” só devem ter relações sexuais de luz apagada, simplesmente para não se olharem umas nos olhos das outras. Ou então com o intuito de poupar na electricidade, com vista a arrecadar os poucos cêntimos que têm para mais tarde gastarem. Muitas delas chegam aos 80 anos de idade sem usufruíram desse pé-de-meia, infelizmente. A maioria destas pessoas têm filhos, “parasitas da sociedade”, como lhes chama a minha mãe. São aqueles filhinhos que moram na casa dos papás a vida toda e que aos 40 anos gritam do quarto para mãe que está na cozinha: “ó mãe frita-me um ovo por favor?”... Em consequência disto, e para piorar a situação, conhecem alguma decadente mórfica num bingo de igreja, casam e levam-na também para casa dos pais. E a pobre mãe, já viciada em remédios e limpezas, fica-se perguntado a onde é que errou na vida para ter gerado um hipopótamo míope e sem pernas e não uma pessoa que pelo menos vai até a padaria sozinha. E se nós perguntamos porquê que não vão viver as suas próprias vidas, eles respondem que não são burros, e que podem simplesmente ficar ali, à espera que os velhos morram para ficarem com a casa. O mundo está cheio disto, atentados.
Bom, mas eles que se lixem. O fato é que eu seria uma suicida em potencial se concordasse e me visse presa nas áreas cinzentas do planeta. É verdade que eu não sou tudo o que queria ser, mas pelo menos não sou o que não queria. Já está razoavelmente melhor, do meu ponto de vista. Mas sempre que sinto a chaleira a ferver dou uns gritos, arranco a roupa, parto alguma coisa, faço alguma maluquice. E o vapor de novo volta para dentro. Por um tempo, é claro. Bom, já disse que sou uma criatura estranha. No mínimo isso. Mas prefiro assim. De qualquer das maneiras, vá eu para onde for, convido sempre os meus amigos. Mas a escolha é deles, óbvio. Geralmente a minha fama chega antes de mim e todos já sabem o que significa conviver comigo. Na verdade ninguém aguenta muito tempo este meu temperamento. Mas já estou habituada. Alguns voltam sempre. Alguns voltam, ficam uns cinco minutos, lembram-se e estampam-me na cara uma vontade absurda de sair a correr. Mas tem sempre um ou outro. Existem também os meninos. E eu tenho o meu menino, que acorda sempre ao meu lado, que aprendeu a sobreviver à minha loucura e que deve ser um pouco mais maluco que eu para estar comigo há tanto tempo. E por volta das três da manhã eu acordo, acendo a churrasqueira no quintal, abro uma cerveja e fico sentada a escrever qualquer coisa esperando que amanheça. Ele levanta-se, senta-se durante alguns segundos ao meu lado, dá um gole na minha cerveja, dá-me um beijo no rosto, diz que me ama e volta a dormir. É, afinal eu não devo ser tão maluca assim...



























 

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